[Crítica] Host: o terror em tempos de quarentena
Atualizado: 17 de fev. de 2021
É interessante notar como a pandemia do COVID-19 nos afetou como sociedade, mas olhando em um eixo ainda mais específico, como afetou o cinema em 2020. Não apenas em questão de agenda (visto que os maiores lançamentos do gênero, Um Lugar Silencioso - Parte 2, A Lenda de Candyman, Invocação do Mal 3 e Halloween Kills foram todos adiados para 2021) mas também como esse acontecimento influenciou, está influenciando e influenciará novas narrativas. Com o isolamento social, muitos cineastas se viram com a oportunidade de experimentar. Um deles foi o britânico Rob Savage.
Logo no início da quarentena, Savage teve a ideia de pregar uma peça nos amigos. Em uma videochamada, ele fingiu estar ouvindo barulhos em seu sótão. O que os colegas não sabiam é que ele havia recortado um jumpscare de REC (2007) e inserido no momento da chamada onde ele posicionava seu celular para filmar o próprio sótão. A experiência inteira foi editada em um curta-metragem que viralizou na internet. Vendo o potencial no material, Savage contou com a ajuda dos amigos Jed Shepherd e Gemma Hurley para transformar uma brincadeira de dois minutos em um longa-metragem de uma hora e três meses depois, Host era lançado no streaming americano Shudder, sob aclamação quase unânime.
A recepção solidificada da crítica é completamente justificável visto que Host é um daqueles casos que acontecem de tempos em tempos no gênero onde o cinema de guerrilha é evocado da melhor maneira. Tobe Hopper fez com O Massacre da Serra Elétrica em 1974, Eduardo Sánchez e Daniel Myrick fizeram com A Bruxa de Blair em 1999, e por aí vaí. É simplesmente a paixão pelo gênero sendo personificada, independente dos poucos recursos. E cada detalhe de Host grita isso.
Em pouco menos de uma hora, Savage constrói uma narrativa surpreendentemente sólida, usando e abusando dos clichês do gênero e do formato, já utilizado em outros exemplares como The Den (2013), Amizade Desfeita (2015) e Buscando... (2018), mas trazendo um frescor revigorante. É um filme sobrenatural sobre uma sessão espírita dando errado. Todos já vimos isso. Mas é a execução que o diferencia pois ele tem a ciência de que está visitando terreno batido.
Talvez o fator mais charmoso dessa pequena pérola da quarentena seja seu valor de identificação. Todos os envolvidos são amigos, química instantânea. A premissa posiciona os personagens na mesma situação em que todos nós estávamos - presos dentro de nossas casas. E o horror não vem do lockdown em si, mas de uma circunstância que evoca um medo ainda mais primitivo: o do isolamento. (Partindo da minha experiência, posso dizer que uma das decisões mais acertadas do meu ano foi não ter assistido Host no final de semana em que foi lançado - em que coincidentemente estive sozinho em casa.) Isso me dá a garantia de que ele irá envelhecer melhor do que outros filmes que tentarão seguir a tendência do vírus.
Construir um susto não é algo tão fácil quanto aparenta e a chave está na antecipação. Savage elabora uma tensão crescente tão afiada que é impossível não prender a respiração por alguns momentos, seja por que você acha que viu dois pés balançando no sótão ou por que certa personagem está tirando fotos do corredor escuro de sua casa quando a energia misteriosamente cai. O uso da tecnologia ao favor delas - e dos sustos - é algo interessante pois eles exploram desde o fundo verde aos filtros faciais disponíveis no aplicativo em alguns momentos.
Indo um pouco mais além disso, tenho que confessar que assistir Host despertou um pouco o meu coração cineasta. Ver o que foi feito com tão pouco - e ainda remotamente! - definitivamente acendeu uma velinha de inspiração. Ainda que não seja inovador, ele consegue trazer uma revigorante execução a um gênero já batido e, se me permitem falar, uma redefinição sobre o que é o cinema de guerrilha nos tempos atuais.
HOST
UK | 2020 | 57 minutos
Direção: Rob Savage
Roteiro: Rob Savage, Gemma Hurley, Jed Shepherd
Elenco: Haley Bishop, Jemma Moore, Emma Louise Webb, Radina Drandova, Caroline Ward, Teddy Linard, Seylan Baxter
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